O Mudhoney veio para a sua sétima tour no Brasil e realizou uma sequência de quatro shows; passaram por Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte – sendo esta última praça o foco deste texto.
O show em Belo Horizonte foi produzido pela Quente e rolou na Autêntica, casa de show de médio/pequeno porte que tem recebido cada vez mais shows relevantes, o que é fruto do trabalho de uma equipe muito competente e que entrega som de qualidade, iluminação espetacular e, por último e não sei se menos importante, banheiros limpos.
Coisas improváveis acontecem nesse lugar; no show do Black Flag, em 2024, o líder e fundador da banda, Greg Ginn, foi pro meio da galera no final do show para jogar conversa fora e tomar caipirinha – aconteceu de novo com o Mudhoney, mas acho que sem caipirinha dessa vez.
Depois da excelente discotecagem da Dj Jujuba e Ctrl Z, o Mudhoney subiu ao palco leve e despretensioso – características indissociáveis da banda. Mark Arm deu um “Olá, Belo!” e disse que ficou treinando essa frase por dois dias. O show começou bem morno, apesar da clássica “If I Think”. A maior parte do setlist de 27 músicas foi composta pelo lançamento mais recente da banda, “Plastic Eternity”, de 2023, mas não deixou de incluir grandes clássicos da banda. Particularmente aprecio bandas que desafiam sua fã base mais chata ao tocar predominantemente material mais novo.
Ao longo do show, o Mudhoney desfilou com um pequeno arsenal de guitarras maravilhosas e timbres arrebatadores, acompanhado de uma cozinha que não se preocupa em fazer só o básico, trabalho do influente baterista Dan Peters, que chegou a tocar no Nirvana.
Tenho a pretensa opinião de que shows memoráveis se provam no palco do meio pro final, porque é o tempo que uma boa banda precisa para conquistar o público e entreter, de fato. E a minha suspeita se confirmou, porque o que o Mudhoney entregou depois foi o que se espera de um show histórico do rock de garagem, que eles tanto ajudaram a se desenvolver.
Mark Arm cunhou o termo “Grunge”, que foi apropriado e promovido posteriormente por Bruce Pavitt, co-fundador da Sub Pop. Foram referência estética para a maior banda do movimento, Nirvana, e tornaram-se a banda que é, ironicamente, a menos grunge do grunge.
São de Washington, região dos icônicos Sonics e palco fértil do hardcore norte-americano dos anos 80, mas também tinham como forte referência as bandas que nasceram no CBGB’s, berço do movimento punk nova-iorquino e as que foram lançadas pela californiana SST, liderada por Greg Ginn, já citado anteriormente. Um traço característico que une essas bandas é, sem dúvida, o espírito garageiro e, portanto, o completo desdém pelo sucesso.
A atitude punk do Mudhoney é o que os trouxe de volta ao Brasil, cientes do espaço que ocupam e da sua representatividade para a música alternativa, ou seja lá qual o próximo termo vago a ser inventado. A banda não dá margem para estrelismos ou extravagâncias. É música, crua e suja, jogada na sua cara e sem a menor preocupação de agradar, utilizando, de preferência, muito Big Muff. Não soam ultrapassados. Desafiam um público que é formado majoritariamente por quarentões, mas que também se renova constantemente.
Afinal, toda nova geração de músicos do rock alternativo e suas vertentes que se prezem passarão em algum momento pelo Mudhoney e decidirão qual a sua própria noção de sucesso e, também muito importante, qual modelo de guitarra irão adquirir.
(foto tirado do vídeo de Gabriel Caetano no YouTube)