John Isberg não deve ser muito conhecido aqui no Brasil, ele tocou numa banda chamada The Firebird Band com Chris Broach (Braid) entre 2001-2006. Conhece? E The Blackouts (2001-2002), já ouviu falar? Não? A lista segue: Evil Tents (2009-2013) e desde então a Tigerbeat, que está gravando seu álbum de estreia e recentemente abriu shows para o The Church e o Psychedelic Furs.
Nada né?
John também é professor do ensino médio em Champaign (Illinois) onde leciona para crianças especiais. Trabalhar com cinema foi uma opção que surgiu após a barra pesar depois de 4 anos convivendo diariamente com estórias de abuso e violência. “Eu adoro estar com as crianças, mas as estórias estavam me consumindo. Tive que sair“, lembra John, que abriu a Swede Films. Sua carreira no audiovisual é extensa, com participação em diversos documentários, aproximadamente 20 videoclipes e publicidade local.
Ainda assim, eu também nunca tinha ouvido falar mas resolvi bater um papo com John porque ele anunciou um crowdfunding para tentar finalizar um documentário chamado “1977-2000 – Where it Begins”, sobre quase três décadas da cena independente norte americana.
MM – Qual a estória por trás da história no doc? De onde veio a ideia de filmar?
John – Falo sobre a ideia por muito tempo. Quando eu tocava no Blackouts, meu colega de banda Joe sempre falava sobre a rica história da nossa cidade e da cena local. Um outro amigo, Seth Fein, me pediu para fazer um mini doc sobre o Pygmalion Music Festival e ao começar a filmar, percebi rapidamente que havia algo maior ali. Minha sensação era de já ter assistido vários documentários musicais dirigidos por pessoas sem qualquer relação com a cena ou que nunca haviam estado em uma bandas… eu acho que o fato de eu ter tocado, viajado e lançado discos me dá uma vantagem que pode somar ao documentário, de torná-lo menos sobre a mística e mais sobre a experiência real e as trocas que todos experimentamos quando estamos numa banda.
MM- Algum livro ou outro documentário como referência (o enredo se parece muito o livro “Our Band Could Be Your Life”)?
Definitivamente! Existe um elemento disso no filme, eu quero que seja algo que as pessoas saiam emocionalmente tocadas e inspiradas, que saiam e montem uma banda, produzam um show, criem um selo, um coletivo. Foi isso que eu busquei ao conversar com Steve Albini, Kim Deal, Joe Shanahan, Peter Katsis, as coisas que os ajudaram, que os inspiraram.
Pensando no tom, eu diria que o livro “Your Band Sucks“ de Jon fine é um ótimo livro. Conversei com ele e acho bacana que ele tenha tocado em bandas e escrito sobre suas experiências, acho que compartilhamos o mesmo senso de humor sobre nossas bandas… nós ríamos o tempo todo sobre as coisas malucas, engraçadas ou tristes que vivemos. E isso tem sido uma das coisas mais bacanas deste processo: muitos livros e artigos celebram a ideia do gênio musical, do iluminado, mas no final das contas, a grande maioria das pessoas em bandas só começaram isso por causa de seu amor por uma música, e isso muda suas vidas dai pra frente. Eu acho que é essa jornada o que eu quero mostrar no filme.
Ainda sobre o tom, eu diria que os documentários “The Wrecking Crew“, “Sound City” e “Pearl Jam: Twenty” tem uma vibe similar. Não quero apenas “cabeças falantes” e arquivo (sobre o formato da maioria dos documentários) então quero muitas imagens de pessoas nas ruas, nos eventos, nos ensaios, nas vans, nas estrada… a dureza do dia-a-dia.
MM – Quem já foi entrevistado e qual o critério para escolher estas pessoas?
Kim Deal (Pixies, Breeders), Mike Watt (The Minutemen), Steve Albini, Jody Stephens (Big Star), Bun E. Carlos (Cheap Trick), Joe Shanahan (dono do Metro Club, espaço para shows de Chicago que ajudou o Smashing Pumpkins no começo), Peter Katsis (empresário de Ministry, Jane’s Addiction, Korn, Smashing Pumpkins – a revista Billboard deu a ele o crédito de melhor empresário do rock dos últimos 30 anos), Mike Skill (The Romantics), Jon Fine (escritor do livro “Your Band Sucks”), Ian Mackaye (Fugazi), Adrian Belew (King Crimson, David Bowie, Talking Heads, Frank Zappa) e dezenas de pessoas da cena de Champaign e Urbana.
Estou entrevistando somente pessoas da música independente norte-americana. Às vezes porque eles representavam algo muito importante para a música, para a época deles, para dar o contexto. Às vezes, eram importantes localmente ou às vezes até importante apenas para mim. Por exemplo, quis falar com Jody Stephens (Big Star) sobre esse momento quando a vida dele mudou, que foi quando ele conheceu seus colegas de bandas na escola. Para mim, estas coisas são bonitas porque são simples e verdadeiras. Esses pequenos momentos que nós não prestamos atenção e que mudam nossas vidas.
MM – Alguém que você tentou mas não quis dar entrevista? Ou que não conseguiu contactar?
Algumas pessoas ficaram empolgadas mas não quiseram falar. E eu entendo. Estes caras devem receber pedidos de entrevista o tempo todo e muitos deles tem medo que suas histórias sejam mal utilizadas ou mal interpretadas. Com outras pessoas, eu fiquei com a impressão que eles acharam que o documentário era nostálgico, algo como reviver “os bons e velhos tempos” e não estavam interessados. Eu também entendo, mas essa não é minha intenção. Eu também gostaria de ter mais opiniões de mulheres mas não consegui muitas entrevistas e isso é um saco.
Existe aquele documentário sobre o Wilco que é realmente desonesto quando trata de Jay Bennett. Eu fiquei muito chateado com aquilo, como os amigos dele aparecem, e conheço pessoalmente vários deles. Existe uma parte do documentário do Wilco, quando eles estão em estúdio e rola um pequeno desentendimento, que foi aumentado para algo muito maior do que realmente deveria ser. Se você já esteve em bandas, você sabe que estes momentos são normais, bandas podem ser malucas, disfuncionais. Então, eu entendo que algumas pessoas sejam cautelosas sobre dar entrevistas. A edição é poderosa, e se você não for cuidadoso, você pode fazer um momento transformar-se em outra coisa.
MM – Porque 1977 a 2000 como período?
Para mim 1977 é o ano quando todos estes álbuns e bandas fabulosas surgiram no underground, de artistas preocupados apenas com o seu jeito de fazer as coisas. Todas aquelas bandas em Nova Iorque, influenciando milhares de pessoas. Tinha o The Clash na Inglaterra, mas eu prefiro o que Joe Shanahan falou sobre os Ramones: “Esses caras se pareciam com os meus amigos, com camisas brancas, jeans e tênis”. Esse sentimento é similar a quando eu conversei com outros músicos que se inspiravam nos Replacements: eles se parecem conosco!. Eu acho que é um tema que persiste durante todo o período, que você podia se identificar com a banda, que eles não eram rock stars, mas pessoas normais. Já o ano 2000 é praticamente o fim dessa sensação, quando começam as trocas de arquivos na internet, e isso destrói todo modelo que estávamos acostumados até então, muitas lojas de disco fechando.
MM – Quando você acha que o documentário estará pronto e quais os planos de exibição dele?
Espero poder inscrevê-lo em festivais em 2018. Existem algumas distribuidoras com quem eu adoraria trabalhar mas sinto que é um processo parecido ao de achar uma gravadora para lançar sua banda. A companhia certa, que acredite nas mesmas coisas que a gente ainda deve aparecer.
Me lembro de ouvir uma estória de um cara que não quis assinar o Nirvana, escutou a demo e não gostou (risos)… Mas, é uma coisa boa. O que poderia ter acontecido ao Nirvana se eles tivessem assinado com aquele cara? Eu acredito no filme e nas estórias das pessoas no filme. Estou confiante que quem assistir ao documentário vai se relacionar com ele. Não é sobre glorificar o Pixies ou o Steve Albini, é muito mais sobre a jornada, de ter sua van quebrada, fazer um show ruim, brigar com seu baterista no meio do deserto, ver sua van pegando fogo, coisas malucas que te fazem rir hoje.
John abriu um crowdfunding para tentar finalizar o filme, que só de pós-produção (edição, videografismo, mixagem de áudio, licenças musicais, pagamento de direitos de arquivo de imagens, etc) vai precisar de 50 mil dólares. Ele estima ter gasto outros 50 mil do próprio bolso durante as gravações. É também a primeira vez que John tenta um crowdfunding, que é um processo arriscado. Dá uma checada: além de uma estória interessante a ser contada, ao participar do crowdfunding você ganha recompensas bacanas, que vão desde o básico download do documentário quando pronto, a posters e cartazes exclusivos, guitarras e itens de músicos do Poster Children, Braid e a (já vendida) guitarra de Jeff Schroeder, substituto de James Iha no Smashing Pumpkins.
Esperamos que o documentário realmente seja concluído. Para participar, você precisa ter um cartão de crédito internacional.