Velvet Underground é mais importante que os Beatles. Não precisa concordar, essa é uma piada interna entre eu e minha esposa. Mas nas discussões de mesa de bar e em festinhas, a coisa foi crescendo em mim até que em 2009 eu comprei um livro chamado “How the Beatles Destroyed Rock n Roll: An Alternative History of American Popular Music” escrito por Elijah Wald.
Para resumir, Elijah reconta toda a História da música negra nos Estados Unidos para mostrar o que ficou encoberto pela afirmação de que os Beatles são a maior banda do Mundo. Lendo o livro, fiquei com a impressão que Lennon, McCartney, Starr e Harrison concordariam com Elijah, de que nem na Inglaterra eles são a maior banda do Mundo.
É óbvio que os Beatles são importantes, que muita coisa do atual mercado fonográfico se estabeleceu com eles. Devo confessar também minha discreta ignorância da discografia da banda. O único disco que eu escutei na íntegra e várias vezes deve ser “Yellow Submarine”. Isso porque meu filho se viciou na faixa-título e eu dei de presente o álbum, que ele escuta regularmente, nas velocidades normal e 45 RPM. Minha impressão que “It’s All Too Much” é uma das melhores músicas do quarteto, em qualquer rotação, permanece.
Os Beatles são superestimados. Esta é outra frase que eu adoro jogar nas discussões de mesa de bar. O problema é que eu mostrei “I’ll Be Your Mirror”, “Sunday Morning” e várias outras musiquinhas mais palatáveis do Velvet Underground para meu pequeno mas não teve jeito: Yellow Submarine it is.
Semanas atrás eu li uma matéria onde meu ídolo (maior que os Beatles, fácil) Kevin Shields do my bloody Valentine fala que as bandas favoritas de todos os tempos dele são Beatles e Ramones. Ahn? Aonde eu errei? Daí, quase que na mesma semana, Brad Laner do Medicine, banda essencial para quem gosta de my bloody Valentine, lança este álbum:
Vendo apenas o título das músicas, você consegue saber do que se trata? Sem ouvir, eu te digo: Laner fez um álbum inteiro de releituras dos Beatles. Antes que você venha me dizer “mas eu te disse, eu te disse”, preciso lembrar que o quê Laner fez foi dissecar os Beatles e não homenageá-los.
Seguindo a lógica do livro de Elijah, o disco começa com uma música que não foi escrita pelos meninos de Liverpool: “Some Other Guy” de autoria de Leiber e Stoller, fazia parte do repertório dos shows do Cavern Club e foi regravada pelos Beatles. A ordem cronológica ajuda na dissecação e a releitura seguinte é do álbum “Hard Day’s Night” (1964). Depois “The Night Before” (1965) da trilha do filme “Help”, “She Said She Said” do álbum “Revolver” (1966) e os primeiros flertes com a psicodelia em “Blue Jay Way” do EP “Magical Mistery Tour” (1967). Fora a versão de 1966, nada muito famoso, concorda?
Depois disso, as outras 3 músicas são releituras das carreiras solo: “On The Bed” saiu no debut de George Harrison, “Wonderwall Music” (1969), “Junk” é da estreia solo homônima de McCartney (1970) e “Photograph” é do 3º disco solo de Ringo Starr, “Ringo” (1973). O que seria a única faixa original, “The Beatles Story”, é na verdade uma colagem muito maluca, que não conta história, nem estória alguma.
É um disco fácil de ouvir, e que talvez eu já tenha escutado mais do que qualquer outro álbum da banda de Liverpool. O que eu gosto na releitura do Medicine é a acidez das guitarras e a falta de açúcar, a seleção certeira por músicas psicodélicas e a quantidade de cores que eles adicionaram. O que Brad Laner e o baterista original do Medicine, Jim Goodall, conseguiram fazer foi chamar minha atenção para algumas preciosidades que devem estar escondidas no repertório dos Beatles, aquela bandinha que eu nunca dei muita atenção.
“On The Bed” saiu também em vinil. Restam pouquíssimas cópias aqui.