Imaginem a seguinte cena: um adolescente no começo da década de 1990, que odiava o que os amigos ouviam e o que tocava nas festas, que vivia num condomínio fechado em Angra dos Reis (ou seja, longe de tudo), que detestava o colégio e que pra saber alguma coisa sobre música devorava qualquer revista do assunto que aparecesse na banca. Bom, agora coloquem isso em tempos pré-internet, em que a loja de discos (qualquer luma) mais perto ficava a duas horas de distância, no Rio de Janeiro.
Difícil, né? Era mais fácil eu ter virado um dos reggaeiros ou metaleiros que tinham por lá e ficaria tudo bem. Mas eu não tinha molejo suficiente para ser o primeiro, nem sabia tocar guitarra naquela velocidade ridícula para entrar no grupo do segundo.
Isso expressa o impacto que algumas bandas tiveram na minha vida. Eu já ouvia muito punk rock e tinha sido abduzido pelo fenômeno “Nevermind”, como todo mundo aliás. Até os reggaeiros e os metaleiros ouviam! Os playboys também! Eu precisava de algo que era “meu”.
Eis que surge na televisão um especial de três capítulos sobre o Reading Festival 92 na Band (conseguem imaginar isso hoje em dia????) que na época era “só” Bandeirantes (ah, era também, obviamente, tempos pré tv a cabo). Sim, meus caros, a Band ajudou a mudar a minha vida. Durante aquelas três semanas eu fiquei grudado na TV gravando e revendo cada episódio. Foi quando eu conheci PJ Harvey (um dos meus primeiros amores), Rollins Band (“ah, o cara do Black Flag”), Public Enemy, e duas das minhas paixões imediatas: Teenage Fanclub e Ride. Na TV aberta, em plena segunda feira. O impacto disso tudo no moleque descrito acima pode ser entendido lendo essas mal traçadas linhas.
Na semana que o “Going Blank Again” faz 25 anos é impossível não me lembrar daquelas quatro músicas. E agradecer por esse disco existir. Era a primeira vez de verdade que eu tinha contato com aquele tipo de música. Feita por caras normais, nada famosos, sem parecer macacos treinados no palco, gente feito eu. Nerds! Que deviam detestar o colégio tanto quanto eu.
Do VHS, eu passei as músicas pro K7 e ouvia sem parar. Em qualquer situação. A parte da fita que tinha “Mouse Trap” já estava nas últimas do tanto que eu voltava e botava pra tocar de novo. E, como dizem, um vício leva ao outro. Passei a querer ouvir mais daquilo. Óbvio que meus problemas aumentaram. Qual publicação falava dessa música? Onde tocava isso na rádio? O jeito? Juntar dinheiro e comprar revista importada, me virar no inglês e grudar na MTV, no programa do Fábio Massari.
Poucos discos me impactaram tanto quanto esse do Ride. Que guitarras eram aquelas? Bem tocadas, cheias de bom gosto, mas não era preciso ser nenhum expert pra fazer aquilo. Era diferente do punk e do Nirvana, dos berros, das guitarras cheias de raiva, havia ali uma melodia que eu queria tanto achar, mas nem sabia que estava procurando. Foram os meus Beatles, sabe? O resultado? Até pesquisa de doutorado o tal do indie virou na minha vida.
Depois disso, graças àquele disco, àquele show, eu quis ter uma banda, aprender a tocar guitarra, comprar camisetas… Fiquei ainda mais “esquisito” aos olhos do pessoal do colégio.
Mas, finalmente tinha encontrado a minha turma.
Em tempo: Ride acabou de lançar duas músicas novas que estão disponível no canal de YouTube oficial da banda.
O 2º álbum de estúdio do Ride completa 25 anos e Luiz Alberto Moura volta à sua adolescência